“Alra” levantou cedo e sete horas estava entrando no trabalho. Ela ficou no faturamento fazendo o serviço cansativo e já conhecido até as nove horas, momento em que foi para a reunião junto do pessoal. A reunião tratou de diversos assuntos sobre todos os setores, mas nada referente ao PABX. De toda forma, estar numa reunião era melhor do que ficar no faturamento e, ademais, era bom para ela tomar conhecimento das demais áreas de atendimento da unidade. A reunião acabou uma hora antes do final do expediente e “Alra” foi informada de que poderia sair e depois fazer uma ocorrência. Isso já não foi muito do seu agrado, mas uma vez tendo escutado isso da coordenadora, não teve como (e nem teria fundamento óbvio) dizer que ia ficar lá dentro atoa só para esperar dar o horário certo. Uma vez na saída foi convidada para ir numa sorveteria a dois quarteirões de distância e, sem jeito de não aceitar, lá foi ela desinteressadamente tomar sorvete com a turma. “Alra” relatou-me estar numa crise de auto-preconceito. Ela se sentia constrangida e desconfortada perto das demais pessoas, pois estas estavam sempre dialogando e “Alra” não sentia vontade de conversar com ninguém a respeito de qualquer coisa que fosse, a menos que o assunto tivesse real importância. Ela sentia preconceito de si mesma por ser introvertida, mas obviamente não queria deixar de ser assim (e nem conseguiria se quisesse). Sua situação era como a de um negro com racismo que não aceita a cor da própria pele, como um pobre que despreza a pobreza, como um obeso que abomina o excesso de peso ou como um paraplégico que se sente o maior doente do mundo. Ser introvertida para “Alra” era sinônimo de muitos aspectos negativos dos quais ela não julgava possuir: como ser tímida, orgulhosa, individualista, anormal, etc.
No fundo ela amava ser introvertida, mas no meio de pessoas puramente extrovertidas ela não conseguia sentir-se à vontade, natural, tranquila ou bem disposta ao que quer que fosse. Trabalhar no PABX era ótimo exatamente por lhe conceder o mérito do mínimo contato pessoal com os demais funcionários, mesmo que durante o momento de lanche ela tivesse que passar sua agonia extrema de ficar no meio de um bando de gente. Ela sempre ficava esperando um burburinho menor para ir até o refeitório, mas obviamente sempre encontrava com uns e outros por lá e isso lhe era péssimo. Ela cumprimentava e engolia o pão velozmente para retornar logo para sua sala isolada. Estar no meio dos outros fazia ela sentir-se muito mal com relação ao seu próprio auto-preconceito, a visão de si mesma enquanto uma pessoa indisposta ao contato humano, à intimidade, a comunicação e ao afeto expresso. Ela não fugia do contato humano, mas o detestava profundamente. Ela se amava enquanto introspectiva, mas no meio dos extrovertidos se sentia tão desconfortável que todo seu ser entrava em um choque fóbico. Lidar com isso não estava sendo-lhe nada fácil. Uma vez tendo a tarde livre, “Alra” aproveitou o tempo conforme pode e meditou bastante sobre si mesma e seus conceitos arraigados de auto-perfeccionismo e auto-senso crítico. A vida continuava lhe cobrando uma postura liberta e flexível mediante o próprio jeito de ser. Sua luta não estava sendo pequena.
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